Polêmica sobre isenção do IPI na compra de carros

A feira Mobility & Show chegou pela primeira vez ao Rio de janeiro depois de sua 3ª edição em São Paulo. Durante os dias 7, 8 e 9 de julho, o evento que ocorreu na Marina da Glória reuniu uma exposição de automóveis, stands com equipamentos modernos e serviços para pessoas com deficiência e mobilidade reduzida, além de debates, palestras e entretenimento.

O clima era animado. A área de exposição agrupou diferentes stands de automóveis de primeira linha de marcas como Jeep, Fiat, BMW, Toyota e Suzuki, além de empresas que produzem adaptações em carros para deficientes físicos e pessoas com dificuldades motoras como a Cavenaghi, Adaequare e Kit Livre – Soluções em mobilidade.

Uma quadra de basquete com atletas cadeirantes divertia as crianças, e uma área especial para test-drives chamou a atenção dos demais. A praça de alimentação com foodtrucks era para todos os gostos, com hambúrguer, tapioca, cachorro quente e acarajé.

A feira também teve mesas de debates e palestras

A primeira mesa de debate do evento teve o tema “Isenções para PCD (pessoas com deficiência) na compra do carro 0KM – Quem tem direito? ”, e envolveu uma questão polêmica sobre pessoas que não possuem nenhuma deficiência ou mobilidade reduzida estarem se aproveitando da lei para comprar carros com isenção de impostos.

Na mesa estavam presentes dois médicos do DETRAN, os doutores Ivan e Elizabeth Natal, o representante da perícia do DETRAN, Rubem Xisto, o médico e cadeirante representante do Centro de Vida independente (CVI-Rio) José Carlos Morais, o Diretor da empresa Adaequare Carlos Eduardo, o deficiente visual Manoel Aguiar e o mediador da mesa, o advogado especializado em defesa de pessoas com deficiência, Ronilson Silva.

O debate iniciou com José Carlos e Carlos Eduardo questionando a liberação para pessoas que não possuem nenhuma deficiência, mas conseguem, mesmo assim, isenção de imposto por consequência de uma doença que não deixou sequela. A pessoa não tem dificuldade motora, mas tem isenção. “Minha vizinha teve câncer de mama e hoje está curada, mas conseguiu comprar um carro com isenção. Isso está errado. O que interessa não é a doença, mas a sequela que ela determina”, criticou José Carlos.

A doutora Elizabeth Natal concordou que não pode haver uma banalização das doenças. No entanto, defendeu que o objetivo, como perita do DETRAN, é dar uma direção com mais segurança para a pessoa com deficiência. Citou, como exemplo, “uma pessoa sem os dois braços não consegue pegar um ônibus, pois não tem como se segurar, e portanto, embora não tenha problema de locomoção, necessita de um carro para se locomover. Então, é dar segurança para viabilizar a direção. “Uma pessoa que com insuficiência renal que se submete a diálise não pode ficar exposta a temperaturas muito elevadas, e por isso, necessita de um carro com ar condicionado”.

Após as apresentações, o debate foi aberto para a plateia, e assim, os ouvintes puderam fazer perguntas aos palestrantes. Paulo, um surdo questionou a colocação da Dra. Elizabeth que considera a surdez um risco para a direção. Alegou que não possui nenhuma dificuldade dirigindo e acrescentou que é mais atento no trânsito por conta de sua deficiência. Aos surdos não é dado o direito de comprar carro com isenção. Mesmo assim, a médica do DETRAN rebateu dizendo que ainda acha que a surdez é um fator limitante para uma direção segura.

O clima esquentou quando Itamar, um deficiente físico que trabalha como despachante junto ao DETRAN de São Paulo questionou a limitação das isenções e disse que deveria ser liberado do jeito que é pois cabe ao DETRAN avaliar as condições das pessoas, e que a Lei existe para beneficiar os deficientes.

José Carlos rebateu e reforçou o que disse no início do debate: o objetivo da Lei não é para beneficiar, mas sim para diminuir as desigualdades e permitir que a pessoa com deficiência tenha direito de se locomover. Além disso, José salientou que o abuso praticado é fruto da pressão econômica exercida pelas montadoras e concessionárias.

Entendendo melhor o debate

Após o debate, conversei com José Carlos e perguntei de que forma a compra de carros com isenção prejudica as pessoas com deficiência e mobilidade reduzida. José afirmou que diretamente isso afeta os que realmente precisam de isenção, pois há demora na liberação dos documentos para a compra do veículo. As concessionárias levam mais tempo para entregar o carro. Assim, uma pessoa que realmente necessita desse veículo demora para consegui-lo.

O médico ainda enfatizou que não é só uma questão da burocracia, mas uma questão ética e de respeito pelo outro. Um exemplo claro é a questão da mastectomia pelo câncer de mama. Esta cirurgia quando se estende as axilas para debelar o tumor pode provocar uma lesão dos plexos nervosos levando como consequência uma paralisia do braço. Portanto, é a sequela provocada pela cirurgia o fator determinante que dá direito a essa pessoa de obter isenção na compra do carro. O câncer de mama em si não lhe daria o benefício.

Como essas e outras doenças estão listadas como potencialmente possíveis, as pessoas apelam para esse fato com a anuência de advogados, médicos inescrupulosos, entre outros para conseguir a isenção. Portanto, é uma questão ética, de foro íntimo. É o apelo para a “lei da vantagem” e o pensamento no individual e não no coletivo. Quando o governo perceber o “abuso” e a enorme perda de arrecadação, pode sobrar para todos, ou seja, a suspensão do benefício para quem realmente necessita.

Depois de passear pela feira, conversei também com o responsável pelo setor de vendas da Suzuki, Hermínio Marcotúlio. Questionei o fato de pessoas sem dificuldades motoras estarem se aproveitando da lei para comprar carros com isenção e como as fábricas lidavam com essa questão. Hermínio, no entanto afirmou que não há como controlar porque quando os papéis chegam, a venda já está autorizada: “Se há alguma falha, a responsabilidade é do DETRAN, nós não temos acesso a essa avaliação”.

Abaixo você confere a lista de quem tem direito de comprar carros com isenção:

Condutores com Deficiência Física, portadores de: paraplegia, paraparesia, monoplegia, monoparesia, tetraplegia, tetraparesia, triplegia, triparesia, hemiplegia, hemiparesia, amputação ou ausência de membro, paralisia cerebral, membros com deformidade congênita ou adquirida, exceto as deformidades estéticas e as que não dificultam o desempenho de função, nanismo (pessoas com altura inferior a 1,45m)

Não Condutores. Pessoas com as seguintes deficiências: física, visual (acuidade visual igual ou menor que 20/200 no melhor olho, após a melhor correção, ou campo visual inferior a 20° – tabela de Snellen – ou ocorrência simultânea de ambas as situações), mental severa, mental profunda e autistas.

Por Joana Morais

Estudante de Comunicação Social (PUC-Rio)




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