Quando escutamos a palavra acessibilidade, principalmente, dentro do contexto arquitetônico, o que nos vem à cabeça? Para que e para quem é feita essa tal acessibilidade? Talvez a imagem de uma pessoa em cadeira de rodas seja uma associação direta. Mas, será que a acessibilidade diz respeito apenas as pessoas com deficiência… física? Com certeza esse é um público bastante emblemático para o qual a acessibilidade é essencial.
Porém, esse grupo não é o único nem entre as pessoas com deficiência. Os direitos e deveres fundamentais são assegurados, em primeiro lugar, em nossa Constituição Federal e seguem o princípio da universalidade, ou seja, abrangem TODOS os cidadãos. Entretanto, a interpretação sobre quem essa universalidade realmente inclui nem sempre é tão clara. A simples garantia ao direito de “ir e vir”, teoricamente dado a qualquer cidadão, é suficiente para se questionar a abrangência do alcance dos direitos mais essenciais.
Quando temos uma escada como único acesso a um banco ou edifício público, o direito de “ir e vir” de um usuário de cadeira de rodas certamente não está garantido. E para essas e outras pessoas poderem usufruir do seu direito, nesse caso, é preciso garantir a acessibilidade.
Mas, a acessibilidade de fato não deve ser pensada ou orientada apenas para grupos específicos, pois esse raciocínio foi o que os trouxe aqui. Cidades, e edificações construídas para um “homem padrão” que não reflete a diversidade, inerente ao ser humano.
Desde muito tempo, a cada desenvolvimento de um produto, projeto de construção ou reforma escolhemos um grupo de pessoas que fará pleno uso dos produtos ou espaços em detrimento de outros. Um dia, tudo a nossa volta eram florestas, nós modificamos o espaço e escolhemos fazê-lo dessa forma. Agora, imaginem se tivéssemos priorizado um outro grupo de pessoas, as pessoas com deficiência, por exemplo? Se tivéssemos construído uma cidade totalmente voltada para elas, sem escadas, apenas rampas, atendimento público só em língua de sinais, bibliotecas inteiras em Braille?! Não poderia ter sido assim? Não é uma escolha? E essa cidade, seria acessível? Não!
Uma cidade assim também não seria acessível. Acessibilidade só existe quando contempla a diversidade que existe entre os indivíduos e, também, ao longo da vida de um mesmo indivíduo. Não nos apropriamos dos espaços da mesma maneira durante a vida. Nossas necessidades mudam.
Você já pensou quantas pessoas diferentes moram no seu prédio ou trabalham na sua empresa? Onde você mora talvez existam crianças, adolescentes, jovens casais, que podem estar pensando em aumentar a família, alguns quem sabe já sejam até avós… Onde você trabalha devem existir algumas pessoas mais baixas, outras mais altas, magras, outras nem tanto… Talvez seu prédio ou sua empresa espelhem, ao menos em parte, a diversidade que compõem nossa sociedade.
Será que todas elas podem usar de maneira segura, confortável e com autonomia todos os espaços do local em que vivem ou trabalham? Sua empresa tem condições de receber um cliente cadeirante ou contratar um advogado cego? Seu prédio permite que qualquer pessoa, seus amigos e parentes frequentem a sua casa? Aquele amigo que quebrou a perna, ou a mãe do seu vizinho que já passou dos 80 e, hoje, se locomove em cadeira de rodas? Afinal, com sorte, vamos envelhecer um dia e, com alguma limitação física ou sensorial, investir em acessibilidade será garantia de maior independência.
Pensando nas diferenças físicas e sensoriais entre as pessoas e nas mudanças que acontecem no nosso corpo, da primeira até a terceira idade, devemos promover mudanças que adotem a acessibilidade de forma ampla, seguindo o conceito de Desenho Universal, o qual busca projetar espaços e equipamentos que contemplem as mais diferentes pessoas, e fases das nossas vidas de forma a assegurar que:
O Desenho Universal procura viabilizar a independência na realização de atividades pelo maior número de indivíduos, considerando a totalidade de suas habilidades e limitações, a partir de propostas de projetos criativos, que devem passar normalmente despercebidos sem segregar.
Esse é o grande desafio… considerar tais conceitos nos projetos e construções de maneira que não sejam percebidos como soluções apartadas, e sim, totalmente integradas e transversais as demandas e requisitos desde sua concepção original. Aliar a estética à funcionalidade é uma questão que sempre permeou o universo arquitetônico. Somando-se a isso, conceber e transformar espaços integrando as soluções e considerando o uso equitativo de todos é essencial para construirmos uma sociedade mais sustentável.
Acessibilidade considera as diversas gerações e a diversidade entre elas na interação com o meio. Como uma dimensão do conceito de sustentabilidade, fundamental hoje, indispensável para haver o amanhã.
As escolhas são diárias, e o desafio está lançado… Para alcança-lo é preciso o comprometimento de todos.
Por Vanessa Goulart